“Viver em rede no século 21:
os limites entre o público e o privado” foi o tema da redação deste ano do
Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). A prova vale uma vaga na universidade
para milhões de estudantes em todo país. Devia também ser critério para
habilitar o Brasil a concorrer a uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU.
Basta a gente pensar no quanto a inteligência governamental se empenhou para
evitar o vazamento da prova. Medidas como impedir que alunos usassem lápis e
caneta com corpo não transparente representam um avanço a ser compartilhado com
todas as nações. Se eu fosse uma vestibulanda de mais visão na minha época,
talvez minha nota tivesse subido significativamente com essas técnicas de
muquiar a cola dentro do miolo do lápis.
Todo esse esforço
governamental não foi páreo para a criatividade da nossa juventude. Que se não
teve acesso ao exame antes da hora – o assunto da redação vazou para um jornal carioca uma
hora antes do tempo mínimo para os alunos poderem deixar as salas – pelo menos
compartilhou via redes sociais o tema da prova. Alguns até, mártires, foram
descobertos tentando contrabandear a informação para a internet. Vai ver era
essa mesmo a ideia, discutir os limites entre a prova privada e a opinião
pública.
No Twitter, a galera começou a publicar depoimentos sob a sigla “#vazoutema”.
Alguns foram particularmente inspirados: “Uma questão social: como podemos
obrigar os funkeiros a comprar fones
de ouvido?”, “Fim do mundo: seu país tem infraestrutura para receber o evento?
Justifique sua resposta”, ou “A história do Corinthians. Observação: não
precisa por título”.
Pense na loucura que foi
entre a arapongagem em Brasília. Ou no pobre coração do ministro, batendo em
descompasso, vendo sua candidatura à prefeitura paulistana naufragar diante do
escândalo em tempo real. Se preferir, pense, nas polícias Federal e Rodoviária
Federal, nos Correios, todo mundo
reunido com vontade de dizer “Não fui eu!”, mas com medo de ser o primeiro –
sabe como é, o culpado, sempre tenta se defender primeiro. Devem ter respirado
fundo quando um jornal divulgou o tema oficial.
Tudo isso poderia ser
simplificado se o Enem mergulhasse fundo nos paradigmas da educação nacional. E
o que seria mais representativo das nossas raízes do que o clássico tema
“Minhas férias”? Seria digno. Todos os alunos deste Brasil já passaram por esse
tema. Pelo menos duas vezes por ano, inclusive. Já adquiriram todo o repertório
e as técnicas necessárias para fazer seu texto em prosa, verso, dissertação,
narração, carta, 140 caracteres, o que for. Desafio qualquer aluno
coreano, norte-americano ou japonês a fazer melhor.
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